Num dos últimos dias do ano, a 20 de dezembro, somos recordados da solidariedade humana. O ser humano, sem solidariedade, nunca teria sobrevivido à natureza implacável e impiedosa. Foi a capacidade de interajuda que permitiu o avanço da nossa espécie, desde tempos imemoriais, “remando” todos no mesmo barco até chegar a um destino que parecia inalcançável.
De todos os inimigos possíveis, grandes e pequenos, neste ano, a humanidade teve de enfrentar um inimigo microscópico. Uma pandemia viral veio abalar, inexoravelmente, as nossas vidas. Mas talvez nunca, em nenhum outro ano, a solidariedade tenha estado tão presente nas nossas vidas…
Ao usar máscara, as pessoas protegeram-se, mas também protegeram os outros, os mais frágeis, de sucumbirem a um vírus novo.
Ao desinfetar as mãos, várias vezes por dia, assumimos uma ameaça comum e lutámos contra o invisível, por nós e por todos.
Mesmo quando o simples sair à rua se tornou arriscado, houve quem não vacilasse e levasse mantimentos e bens de primeira necessidade às casas dos mais desfavorecidos que estavam “presos” no lar.
Sem nos apercebermos, todos nós fomos solidários uns com os outros, durante este ano que passou.
“Sentimento de missão e de abnegação”
Mas foi provavelmente na Saúde que a solidariedade humana brilhou um pouco mais intensamente. Claro que este valor se materializa no cuidado a quem sofre, e no confortar quem mais precisa, mas foi o sentimento de missão e de abnegação dos profissionais de saúde que levou o nosso Serviço Nacional de Saúde a horizontes que pareciam impossíveis.
Sem nunca deixar de estar presente, sem nunca deixar de pensar no utente, foram reorganizados os vários serviços do SNS, muitas vezes de um dia para o outro: consultas de 10 minutos foram transformadas em telefonemas sem limite de duração; urgências não conseguiram acolher todos os profissionais dispostos a ajudar mais horas; cirurgias em atraso foram recuperadas em tempo recorde; plataformas de vigilância foram criadas para que nenhum utente ficasse esquecido; e a Vacinação nunca teve falta de enfermeiros disponíveis.
Claro que nem tudo foi perfeito, houve situações que falharam, mas por cada derrota os profissionais tentaram compensar com o dobro ou o triplo das vitórias.
Passaram-se, assim, meses e meses de tarefas que pareciam intermináveis aos profissionais de saúde, e foi a satisfação destes atos solidários que fez o SNS persistir.
Mas ainda não podemos baixar os braços, nem podemos fechar agora os nossos corações. Falta enfrentar as doenças de inverno e falta a campanha de vacinação massiva que se adivinha complicada, mas necessária.
Com certeza que 2020 foi um ano que não deixará muitas saudades, mas foi nesta catástrofe global que se viu o melhor da humanidade. Vamos, por isso, precisar de mais um ano solidário, em que serão os pequenos gestos que farão a grande diferença.
*Filipa Figueiredo, Enfermeira no SNS