VOUZELA, 13 de Junho de 2025
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Obrigado, daqui ao fim do mundo

30 de Junho 2020

A TI. Sim, a ti, que cedo te apercebeste que esta crise pandémica nos poderia ferir de morte, tão grave ela foi – e é – e tanto assustou a comunidade da nossa região, muita dela já de idade menos jovem e de corpo rompido no trabalho de uma vida inteira, repartido entre os afazeres de cada dia para criar os filhos e as demais obrigações que nem sempre lhe deram tempo e oportunidade para vigiar a saúde mais de perto.

Apercebeste-te cedo, pelo susto causado e pela incapacidade de reacção que gerou, que o raio do vírus vinha de má fé.  Em mim, Jornal de província,  consciente da responsabilidade editorial que me condiciona e fascina, apercebeste-te – dizia –que eu iria ter dificuldades, muitas, e quem sabe se me deixar abater.

Sentindo isso, procuraste-me. Para me dizer “eu estou aqui, nós estamos aqui”. Num instante fizeste um raciocínio geométrico, indicando que irias sensibilizar fulano, alertar cicrano, recordar a beltrano que era preciso dar uma mão. Foste grande e rápido ao perceberes que vinham lá ventos da desgraça e soubeste estar quando era importante estar. Que bem me soube a tua chamada!… Que bem me fez a tua palavra de coragem!… Tão bem, que hoje ouço ainda as palavras que repetiste para que fossem além dos ouvidos e me chegassem à alma. E chegaram. Uns momentos depois eu era já outro eu. Não sorria ainda, mas respirei mais fundo. Começou aí o “vamos lá” que tinha sido o teu desafio e não podia recusar. Foste grande, enorme, repito. Nunca saberás a força que certas palavras ganham quando vindas de lá de dentro, lá algures onde o entusiasmo e a coragem se abraçam, se amam e geram um futuro novo.

A TI – Que me lês no intervalo dos teus afazeres, muitas vezes à noite quando te sentas finalmente. Um pouco à semelhança dos teus pais, dos teus avós, que me liam também muitas vezes ou à hora da sesta ou então à noite à luz da candeia. Estavas a ler-me nos princípios de Março e viste que estávamos a precisar de ajuda. E disseste para os teus: amanhã vou a Vouzela ou a Oliveira. E foste. Foste pagar a tua assinatura que te tínhamos pedido para antecipar. Outros, pensando o mesmo, foram ao banco e transferiram os 30 euros que eram muito para ti e tanto para mim, eu sei. Pelo Correio enviaram outros tantos. Uma dezena, duas, três. Uma centena, duas, quatro, seis, sete. De Portugal todo, onde estamos e donde somos. Do Brasil, da França, da Suíça, da Alemanha, da Austrália, de Espanha, eu sei lá … donde não somos mas onde estamos, porque há gente nossa, do Jornal e de Lafões, em tudo quanto é país de trabalho honrado. Chegaram de mais de 15 países, num movimento de apoio nunca visto em situações destas. Reagir assim, só Lafões. Assinantes assim, só os do “Notícias de Vouzela”. Muitos de vós pagaram este ano e algum ano atrasado. Outros pagaram este e os próximos. Houve quem renovasse a sua assinatura até 2025. Acreditar, na vida e nos projectos, renova as forças e o ânimo. Como houve também quem fizesse questão de vincar o seu apoio, transmitir através dele o empurrão na hora certa, indo além do que seria legítimo esperar.

Tu, tu que tens em ti tantos vocês, foste extraordinário. Decisivo. Acredita. Tu, e os tantos que há em ti e sem se conhecerem muitas vezes, dão sentido a essa corrente enorme que, regada pelas saudades do nosso chão, se encontraram neste enorme abraço solidário, unindo quatro dos cinco continentes. Que grande ajuda tu, e os todos que há em ti, nos deram!… Mas deixa que te diga: exemplo igual ao teu, reagindo logo de imediato e no tempo próprio, de tão longe e tão perto, não há muitos no mundo da comunicação social. Podes crer.

A TI – A ti, autarca, que à tua maneira, dentro das tuas possibilidades, da forma como pudeste, mandaste o teu abraço de apoio. Percebeste, tu e quase todos, que o “Notícias de Vouzela” não é um negócio, não é um projecto de ninguém. É uma causa de toda uma região, é uma voz, é um soldado raso na defesa dos interesses de Lafões, a teu lado, para que nos respeitem e nos considerem cidadãos de corpo inteiro. O interior do país e, nele, Lafões, não tem de ser o eterno sacrificado, o espaço das estradas estreitas, das escolas fechadas, da assistência médica ocasional, dos correios que vêm quando vêm, do emprego que escasseia. Tu, tu e as aldeias que são parte importante do espaço que preenche o maior quinhão das tuas preocupações, não são a terceira divisão da sociedade etilizada que governa o mundo, abraçada à indiferença por quem tem pouco, por quem precisa, por quem passa mal, por quem tem fome às vezes. Repara que ainda agora, há meia dúzia de dias, nos tentaram tirar o helicóptero que tem estado ali em Viseu (antes esteve em Santa Comba Dão) e que era a ambulância dos mais aflitos e que ajudou a salvar tantas vidas, transportando os doentes mais graves para hospitais melhor equipados. Tentaram pegar nele e levá-lo lá para baixo, Loures algures, onde não fazia falta nenhuma. Valeu-nos a pronta reacção de alguns autarcas e alguma imprensa para impedir essa medida, sabe-se lá até quando. Eles, os lá de baixo, esfolam o interior até ao tutano, tiram-nos tudo, e só não nos tiram a honra porque a temos agarrada a um sítio que agora não digo e, além disso, nem saberiam o que fazer com ela. É roupa que eles não usam. O “Notícias de Vouzela” existe para isso mesmo, para lhes dizer na cara que eles, muita da politicagem lá de baixo, é muitas vezes indigna dos cargos que ocupa.

Tu, autarca, que compreendes o valor e a imprescindibilidade da imprensa livre e responsável, soubeste, quiseste, ouvir-nos. Sabes uma coisa? Ser autarca é isso mesmo. É ouvir, escutar, tentar entender, é ir ver, ir falar, estudar soluções, é dar voltas à cabeça para saber onde ir buscar os tostões que, de tão contados, esgotam o ano e ainda Março vai a meio. Ser autarca, na Junta, na Câmara, é inventar soluções, conceber esquemas sadios de resolução, é fazer ouvir a sua voz, é sensibilizar, insistir, ir mais além se necessário, protestar se preciso for. Mas se necessário, é também ver quem precisa, ver como estão os mais expostos – sim, eu sei que o fizeste vezes sem conta, agora com esta peste covarde. É acreditar no milagre dos pães. Eu sei, nós sabemos, que as rosas da Rainha Santa Isabel nunca deixaram de o ser. Mas a mensagem do milagre não está nas rosas transformadas em pão. O milagre está em acreditar que podemos fazer sempre um pouco mais por quem precisa. Foi aqui que Isabel de Aragão se fez santa, porque rainha já ela era.

A TI. Imaginavas tu, antigo Assinante que o deixaste de ser, pela idade ou qualquer outra circunstância, que nada podias fazer e fizeste tanto. Aquele telefonema, aquele recado, aquela luz com que acendeste naquela manhã, naquelas manhãs que teimavam não clarear, tudo isso foi tanto e foi tão bom. Não deixes de o fazer mais vezes. Não deixes que o vírus nos separe. Que ele nos tire a vida, vá lá. Mas que ele tire à vida o sentido e a nobreza que ela tem, não deixes. Cuida-te, mas vem. Protege-te, mas vai. Leva o abraço aos nossos mais velhos que te esperam. Fá-los ouvir a tua voz, cujo som será para eles o melhor dos seus remédios. Vai. Vai, sem deixar de ficar. O gesto, a palavra, a mensagem, já enche de esperança e motivação a taleiga que vamos preparando durante a vida para levar connosco para a cova. Cova a que agora muitos nem direito a ela tiveram. Sentimos que continuas connosco, que continuas a ser “Notícias de Vouzela”. Foi bom ouvir-te ou ler-te. Não te vás. Fica por perto. E se puderes, volta. Esta é a casa dos abraços inacabados.

A TI. A ti e aos teus, à Teresa, a tantos que tu és. Ter-te por perto é uma dádiva da natureza. Vês o que outros não vêem. Adivinhas o que vem longe. Lês o futuro como se fosse sina de cigana. Nem sempre estás. Fizeste da vida uma peregrinação de trabalho. Mas mesmo não estando, estás. Mesmo partindo, ficas. Mesmo calado, falas. De mãos nos bolsos, apanhas horizontes. Já nos encontrámos várias vezes na vida. Sempre com enorme gosto da minha parte. Sempre do mesmo lado das causas que abraçamos. Tem querido o destino que assim seja. Ajuda-me a estar à altura dos teus sonhos que já deram pão a tanta e tanta gente. Que já deram futuro a quem tinha a enxada como destino. Que abriram horizontes para além das courelas que eram o mundo – o único mundo – de tantos de nós. Foste tu que empurraste muito do pão levado à casa de cada um e com que nobreza e descrição o fizeste, pelas aldeias da tua freguesia e para além dela. Eu fiz a marmita mas eras tu que arranjavas o pão que lhe enchia o nada. Foste tu que estiveste ali. E ali. Mais ali. Em todo o lado, onde a necessidade te chama e onde vais, protegendo com o silêncio os passos que dás.

Agora, voltaste a estar aí. Atento e disponível ao primeiro momento. Vendo cedo o que aí vinha quando muitos de nós não enxergávamos ainda um palmo à frente do nariz. Em ti tudo parece simples. Quando se é competente e bom, a natureza ajuda e põe na tua boca a palavra que mata a fome, que mata a sede, mantendo viva a esperança. Acredita e ouve-me, a mim, que penso palavra por palavra que essa é a minha função: tu és grande, enorme. Obrigado. Fica comigo. Fica connosco. Tu não és apenas tu. Tu és tu e muitos mais. És o Afonso Henriques, de Ourique, o IV, do Salado; o Alves Pereira, de Aljubarrota; o Gama, das naus; o Infante, das tuas constantes viagens; o orgulho das nossas gentes. Fica connosco. Dá um abraço à Teresa.

A TI. E a ti, que me trouxeste até aqui. A ti também. A todos os “tus” que há em ti, o abraço destes 85 anos, longos e sofridos por muitas gerações e onde foste parte e parte inteira. Obrigado grande, muito grande. A ti e a todos os “vós” que cabem em ti e em ti simbolizaram tão nobres gerações que te entregou, nos entregou, esta tarefa que teve início há 85 anos e que temos o dever de levar, de poldra em poldra, até às margens do infinito.

A TI, gente empreendedora de Lafões, morada de empresários combatentes, terra onde o capital investido e o trabalho nunca regateado se entreajudam em busca de uma vida digna, com a consciência que só essa entreajuda produz riqueza que garante o pão. Pão que agora também connosco repartiram, nas circunstâncias tão difíceis que a todos atingiram. Mas quando com amizade se faz, o menos é sempre tanto…

A Ti, vós também. Todas vós. As que dentro de portas tão bem assumiram o sentido do dever, não regateando o esforço gigantesco a que as circunstâncias nos obrigaram. Estiveram, estiveram muito bem, e fizeram-no com competência, com brilho, com alegria e com esperança renovada a cada manhã. As ajudas amigas que vieram de fora entendam-nas também como um grande abraço a todos vós.

Obrigado.

                                                                                                        Notícias de Vouzela


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